Há, sem dúvida, políticos muito pouco recomendáveis. Infelizmente, são vários os casos de condutas menos próprias de alguns políticos, entre tráfico de influências ou corrupção, e o uso de moradas diferentes das reais para sugar mais algum com despesas de deslocação, temos várias notícias que denunciam (e bem) estas práticas. Mas tal como a cobertura de conteúdo do Chega, apenas esta parte negra da política tem direito a espaço no circo mediático que domina a comunicação social. Fica desta forma, uma causa tão nobre descredibilizada, gerando descrença, desinteresse e até repulsa nos eleitores. O resultado? Altas taxas de abstenção e uma porta de entrada para extremismos, de esquerda e de direita. O fenómeno não é novo, tanto que o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português, cujo trabalho sindical reconheço-lhes bastante mérito, são considerados partidos perfeitamente normais hoje em dia, tão vocais sempre com o seu partido gémeo do quadrante oposto. Se dúvidas ainda houver, analisem a transferência de votos da extrema-esquerda conservadora (PCP), para o Chega.
Mas e tudo o resto? Com mais de duzentos e trinta deputados, todos os seus assessores, milhares de autarcas e ainda mais militantes-base que apenas contribuem com o seu tempo livre para melhorar as suas freguesias, concelhos, regiões ou o país, não há um único bom exemplo, digno de nota? Não vende, não gera emoções nas audiências, portanto não tem interesse.
Mesmo nas esferas mais altas da política nacional, os que se sentaram na Assembleia da República, andam todos em negociatas, fugas ao fisco ou a alimentar o ego? E será que compensa?
Vejamos a coisa deste prisma: entre obter o voto de confiança no partido para ser candidato e o voto dos eleitores para ser eleito, as horas de preparação para reuniões, discursos e intervenções, mais as inaugurações e outras representações, e não esquecendo o trabalho de investigação para acompanhar a atualidade, prática imprescindível para o desempenho de funções públicas, as oito horas por dia não chegam, nem cinco dias por semana. Vamos juntar a este cocktail a precariedade da certeza que o cargo que desempenha não é um “trabalho para a vida”, sempre dependente da opinião de quem por vezes não percebe, ou pior, não quer perceber o trabalho desenvolvido, a completa intrusão na esfera privada e, por vezes, familiar (recordo-me que um deputado ir passear o cão de pijama já chegou a ser notícia há não tanto tempo assim), as pressões e aliciamentos de grupos de interesses, a falta de reconhecimento do seu trabalho, a desconfiança à priori (sejamos honestos, um político sob o qual paire qualquer suspeita, seja levantada discretamente por opositores de outros partidos ou até do mesmo partido fazem de si automaticamente culpado aos olhos das massas), sem esquecer que muitos dos que se dispõe a servir o seu país desta forma, têm plena noção que poderiam estar a ganhar muito mais no setor privado. Talvez não seja assim tão aliciante, não?
Por isso é que quando vejo um político que se digne e cumpra as suas funções sem fraquejar nas armadilhas ou tentações, só pode ser digno de admiração. E neste tema, há sempre um nome que me vem à cabeça como o expoente máximo do oposto, a referência que tenho de integridade moral e trabalho na política — Cecília Meireles. O legado que deixou na Assembleia da República, com os seus discursos, o seu trabalho implacável nas comissões de inquérito e a sua dedicação, levam-me a querer acreditar que a política é um pomar que não deve ser julgado pelas maçãs que aqui e ali estão podres. Ao se descobrir uma maçã efetivamente podre, tem de ser retirada de imediato para não contaminar o resto, mas o pomar permanece deslumbrante.
No nosso distrito temos também dezenas de autarcas dignos de nota. Acredito que desporto e juventude são dos pelouros com um grau de exigência mais elevado a nível pessoal, com muito trabalho e eventos a desenvolver e participar, com horários muito pouco “family friendly” e por isso, a título de exemplo, não poderia não destacar outro grande nome feminino da política — Catarina Araújo, vereadora da Câmara Municipal do Porto.
Juntemos também os milhares que, seja por falta de oportunidade ou porque a vida profissional não lhes permitem dedicar mais tempo, investem o seu tempo livre em regime de voluntariado a variadíssimas atividades políticas, cívicas ou partidárias. Uns mais velhos, outros mais jovens, nas suas freguesias, nos seus concelhos, nos seus distritos, fazem política às suas custas, por convicção. Os bons exemplos são avassaladoramente mais que os maus, simplesmente são uma maioria silenciosa.
Não é por existir um ou outro jovem que aos vinte e poucos anos, acabado de sair da faculdade, é escolhido como adjunto de um ministro, que automaticamente as juventudes partidárias são uma fábrica de tachos, não é por haver bancadas com familiares e amigos feitos antes de entrar na política, que automaticamente a política é só feita de muitas cunhas e muito pouco mérito e trabalho, não é por haver políticos que se apresentem como netos de sapateiros, que automaticamente todos os políticos são hipócritas. Portugal não precisa de limpeza. Portugal necessita de uma justiça rápida, eficiente e independente, com juízes que sejam tão bem escrutinados quanto os políticos, e que sejam repreendidos quando são detetados excessos de falhas pelos seus pares ou superiores, em vez de serem promovidos. Portugal precisa de mais políticos que se dediquem à política, tendo em mente as dificuldades e sacrifícios inerentes à atividade, para evitarem atalhos e alternativas. Porque ser político é duro. Mas também é por isso que é gratificante!
Hugo Gonçalves